quinta-feira, fevereiro 17, 2011

O principezinho...



"-Olá, bom dia!-disse a raposa
-Olá, bom dia!-responde educadamente o principezinho, que se virou para trás mas não viu ninguém.
-Estou aqui, debaixo da macieira-disse a voz.
-Quem és tu?-perguntou o principezinho- És bem bonita...
-Sou uma raposa-disse a raposa.
-Anda brincar comigo-pediu-lhe o principezinho.-Estou tão triste...
-Não posso ir brincar contigo-disse a raposa.-Ainda ninguém me cativou...
-Ah! Então, desculpa!-disse o principezinho.
Mas pôs-se a pensar, a pensar, e acabou por perguntar:
-"Cativar" quer dizer o quê?
-Vê-se logo que não és de cá-disse a raposa-De que andas tu à procura?
-Ando à procura dos homens-disse o principezinho.-"Cativar" quer dizer o quê?
-Os homens têm espingardas e passam o tempo a caçar-disse a raposa.- É uma grande maçada! E também fazem criação de galinhas. Aliás, na minha opinião, é o único interesse deles. Andas à procura de galinhas?
-Não- disse o principezinho.- Ando à procura de amigos. "Cativar" quer dizer o quê?
-É uma coisa de que toda a gente se esqueceu-disse a raposa.- Quer dizer "criar laços"...
-Criar laços?
-Sim, laços-disse a raposa.- Ora vê: por enquanto tu não és para mim senão um rapazinho perfeitamente igual a cem mil outros rapazinhos. E eu não preciso de ti. E t também não precisas de mim. Por enquanto eu não sou para ti senão um araposa igual a cem mil outras raposas. Mas, se tu me cativares, passamos a precisar um do outro. Passas a ser único no mundo para mim. E eu também passo a ser única no mundo para ti...
-Parece-me que estou a perceber- disse o principezinho.-Sabes, há um acerta flor... tenho a impressão que ela me cativou...
(...)
-Tenho uma vida terrivelmente monótona. Eu caço galinhas e os homens caçam-me a mim. As galinhas são todas parecidas umas com as outras e os homens são todos parecidos uns com os outros. Por isso, às vezes, aborreço-me muito. Mas, se tu me cativares, a minha vida fica cheia de sol. Fico a conhecer uns passos diferentes de todos os outros passos. Os outros passos fazem-me fugir para debaixo da terra. Os teus hão-de chamar-me para fora da toca, como uma música. E depois, repara! Estás a ver aqueles campos de trigo ali adiante? Eu não gosto de pão e, por isso, o trigo não me serve para nada. Os campos de trigo não me fazem lembrar nada. E é uma triste coisa! Mas os teus cabelos são da cor do ouro. Então, quando tu me tiveres cativado, vai ser maravilhoso! O trigo é dourado e há-de fazer-me lembrar de ti. E hei-de gostar do som do vento a bater no trigo...
A raposa calou-se e ficou a olhar para o principezinho durante muito tempo.
-Se fazes favor... Cativa-me!- acabou finalmemte por pedir.
-Eu bem gostava- respondeu o principezinho,- mas não tenho muito tempo. Tenho amigos para descobrir e uma data de coisas para conhecer...
-Só conhecemos o que cativamos- disse a raposa.- Os homens deixaram de ter tempo para conhecer o que quer que seja. Compram as coisas já feitas aos vendedores. Mas como não há vendedores amigos, os homens deixaram de ter amigos. Se queres um amigo, cativa-me!
-E tenho de fazer o quê?- disse o principezinho.
-Tens de ter muita paciência. Primeiro, sentas-te longe de mim, assim, na relva. Eu olho para ti pelo canto do olho e tu não dizes nada. A linguagem é uma fonte de mal-entendidos. Mas podes sentar-te cada dia um bocadinho mais perto...
O principezinho voltou no dia seguinte.
-Era melhor teres vindo à mesma hora- disse a raposa.
-Por exemplo, se vieres às quatro horas, às três, já eu começo a estar feliz. E quanto mais perto for da hora, mais feliz me sinto. Às quatro em ponto hei-de estar toda agitada e toda inquieta: fico a conhecer o preço da felicidade! Mas se chegares a uma hora qualquer, eu nunca vou saber a que horas hei-de começar a arranjar o meu coração, a vesti-lo, a pô-lo bonito...
Precisamos de rituais.
(...)
E o principezinho cativou a raposa. Mas quando se aproximou a hora da despedida:
-Ai!- suspirou a raposa- Ai que me vou pôr a chorar...
-A culpa é tua- disse o principezinho.- Eu não te desejava mal nenhum, mas tu pediste para eu te cativar...
-Pois pedi- disse a raposa.
-Mas agora vais-te pôr a chorar!- disse o principezinho.
-Pois vou- disse a raposa.
-Então não ganhaste nada com isso!
-Ai ganhei, sim senhor!- disse a raposa.- Por causa da cor do trigo... "

"O Principezinho" de Antoine De Saint-Exupéry


PS: "Sejam Felizes!"

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